sexta-feira, 15 de setembro de 2006

Entrevista ao Relógio - "Não conheço Portugal"


Diário de Fictícias – Mesmo à hora marcada, senhor Relógio. Há muito tempo que não tinha um entrevistado tão pontual.
Relógio –
Pois, calculo. Eu chego sempre a horas. Aliás, é o que eu faço para viver.

DF – Esta ideia de o entrevistar já tem uns anitos, mas não me tem sido possível contactá-lo, não tenho tido tempo para nada… São muitos os assuntos a resolver e, por vezes, nem dou conta do passar das horas… Bem, já se está a ficar tarde, e eu para aqui a falar. Já agora, que horas são?
Relógio –
Olhe, se continuar a falar dessa maneira, são horas de ir para a cama… Mas eu vim para uma entrevista, e o tempo vai passando. Estamos mesmo em cima da hora!

DF – Peço imensas desculpas, não voltará a acontecer. Senhor Relógio, a sua vida tem sido pautada pelo rigor e disciplina. Nunca desejou sair dessa rotina diária, adquirindo, dessa forma, uma maior liberdade?
Relógio –
Sim, é verdade. Sempre tive uma vida regrada, não sei viver de outra forma. Por outro lado, já tive as minhas recaídas e pensei em desistir de andar às voltas mas tenho três verdadeiros amigos muito importantes para mim: o ponteiro dos segundos (o irmão mais novo), o ponteiro dos minutos (o irmão do meio) e o ponteiro das horas (o irmão mais velho).

DF – Espero que nunca desista, porque sem si as coisas seriam bem mais desorganizadas que agora. E olhe que neste momento, o mundo não é propriamente um Paraíso. Por falar no Éden, qual é o seu país de eleição para trabalhar?
Relógio –
Adoro a Suíça, o meu país de eleição. Também gosto muito de Inglaterra, um país fantástico para mim. Aliás, o meu irmão Big Ben tem residência fixa em Londres. Lá, o tempo pode não ser o melhor mas o meu verdadeiro tempo é excelente, se é que me faço entender... Gosto, essencialmente, de viajar pelos países do norte da Europa, bem como por outros países dos restantes continentes.

DF – Qual a opinião que tem sobre Portugal?
Relógio –
Desculpe, não percebi bem a pergunta… Qual a opinião que tenho sobre quê? Sobre Portugal? Não conheço esse país… Pode ser pura ignorância mas nunca o visitei nem sequer ouvi falar dele…

DF – Sabe (atrapalhado), eu sou um jornal de Portugal… Pode não parecer, mas esse pequeno rectângulo “à beira-mar plantado” é um país… Um grande país, com uma enorme tradição e reconhecida glória pelo mundo fora…
Relógio –
Ah sim… Portugal, não me lembrava de ter estudado esse País na escola, mas agora estou a recordar-me. Nunca o visitei, e pouco dos meus familiares visitaram mas acredito que seja um belíssimo local para viver…

DF – O senhor referiu os seus tempos de escola. Qual era a sua disciplina preferida?
Relógio –
Sempre fui um bom aluno, especialmente a matemática. Contudo, chegava uma altura em que eu não conseguia raciocinar mais e os números faziam-me andar à roda… Mas orgulho-me de nunca ter faltado às aulas e de, acima de tudo, ser muito pontual.

DF – Pontualidade é uma característica muito apreciada por si mas também pelo meu estômago, que já está a dar horas… Mas ainda tenho umas perguntas para lhe colocar… Há quem diga que, para o usar, é preciso ter pulso…
Relógio –
Não é essencial, mas actualmente é aconselhável. Contudo, nestes últimos anos tenho-me sentido muito bem nas paredes de sala e nas torres mais altas das cidades. Também já andei muito nos bolsos dos mais ricos, e passei grandes aventuras na areia e na água… O sol é o meu companheiro mais antigo, acabando por ser o meu próprio relógio biológico.

DF – Foi muito agradável ter falado consigo, mas o tempo passou a voar… Não obstante, podemos falar agora, de forma mais relaxada, off record…
Relógio –
Desculpe, mas não tinha uma reunião marcada para agora, em Portugal?

DF – Sim, mas não se preocupe, porque lá no meu país nós próprios criamos o nosso horário. E aquilo a que o senhor chama de pontualidade, nós chamamos de impossibilidade. O único horário com que nos preocupamos é com o horário de saída.

Sem comentários: