A Música Portuguesa actual está, indubitavelmente, associada ao fenómeno Pós-Modernista que a nossa sociedade atravessa. A inclusão de determinados conceitos pós-modernos na nossa música faz dela um dos pilares vanguardistas do tempo actual. A Naifa, Deolinda e Donna Maria são três conjuntos musicais que reúnem características muito próprias mas, simultaneamente, idênticas entre si. Este é um fenómeno que está, gradualmente, a ganhar uma forma mais vincada no panorama musical português. São cada vez mais as bandas que unem vários universos musicais, através da junção de instrumentos, vozes e até roupagens.
Atravessamos um período pós-modernista em que vivemos e construímos com base na recolha e na reutilização de ideias e conceitos que tiveram lugar no passado. Com isto, não estamos a querer dizer que aniquilámos a nossa criatividade e que apenas existimos e produzimos com mero recurso ao que já aconteceu, ao que já existiu, ao que já se disse. Antes pelo contrário. A Pós-Modernidade é caracterizada como uma forte aptidão para o unir de diferenças que, juntas, podem funcionar melhor ou, pelo menos, de uma forma distinta. Desta forma, há um caminho que nos conduz à inovação. Esta ideia de inovar emerge com o pensamento moderno. Uma outra ideia associada ao conceito de evolução é a do paralelismo entre a Arte e Sociedade. A conjugação destas duas ideias justifica a inovação, uma vez que a História não se repete. O pós-modernismo não é uma invenção, uma teoria, uma tese, uma ideologia. O pós-modernismo é o que estamos a viver. É o mundo em que estamos embutidos que é diferente do mundo de Marx. É a complexidade, a difusão, o pluralismo, são as múltiplas faces de um mesmo entendimento, são as diversas formas de interpretação, é a possibilidade de flexibilização, é o fim do maniqueísmo puro e simples, é o fim dos códigos prontos, da escravidão pela religião com deus e sem deus. O pós-modernismo é o materialismo.
A música portuguesa tem sofrido algumas alterações nos últimos anos. Apesar de se manterem nomes incontornáveis como Carlos do Carmo, Rui Veloso, Sérgio Godinho, Jorge Palma, Xutos & Pontapés, entre outros, há toda uma panóplia de artistas que se vão renovando a si mesmos e à própria música nacional. A introdução de novas sonoridades, através da inclusão de instrumentos já “esquecidos” ou menos apreciados, o regresso da recordação ou a retoma do espírito nacional e da tradição local são características da nossa música actual.
Nomes como A Naifa, Deolinda ou Donna Maria têm ganho enorme relevo e importância numa sociedade que, cada vez mais, se afirma como sendo Pós-Modernista.
A Naifa é uma banda que une as linguagens clássicas do fado e do pop, criando um universo tocado por percussão, baixo eléctrico e sintetizadores. Alguns dos seus membros têm formação na escola do punk, o que reflecte a diversidade que existe dentro da banda. O baixo e a bateria dão-nos uma secção rítmica que acompanha na perfeição o dedilhar da guitarra portuguesa, que se por vezes nos faz lembrar Carlos Paredes, viajando pelo blues e pelo rock.
Deolinda é um original projecto de música popular portuguesa, inspirado pelo fado e as suas origens tradicionais. Formado em 2006 por quatro jovens músicos com experiências musicais diversas (jazz, música clássica, música étnica e tradicional), procuram, através do cruzamento das diferentes linguagens e pesquisa musical, recriar uma sonoridade de cariz popular que sirva de base às composições originais do grupo.
Os Donna Maria são um trio da grande Lisboa, com Marisa Pinto na voz, Miguel Ângelo Majer na bateria e programações e Ricardo nos teclados e samplers. Têm fortes influências da música electrónica e uma alma profundamente portuguesa bem patente no recurso a instrumentos tradicionais, como a guitarra portuguesa ou o acordeão. Neste contexto, os Donna Maria pretendem devolver a desejada frescura à Música Portuguesa através da sua visão electrónica e contemporânea.
Donna Maria foram uma bela surpresa no panorama musical português. Canções pop que vão buscar influência simultaneamente ao trip-hop e às raízes culturais portuguesas fazem deste grupo um dos excelentes exemplos da cultura pós-modernista associada à música portuguesa.
Estas três bandas portuguesas (A Naifa, Deolinda e Donna Maria) contêm na sua génese uma mistura de vários géneros musicais, o que lhes permite uma versatilidade muito grande e uma abrangência musical que se estende a vários ramos. Esta multiplicidade e desmembramento quase “natural” destas bandas faz com que se enquadrem no estilo Pós-Modernista. Para além disso, a inclusão de instrumentos vários (muitos tipicamente portugueses) na construção criativa da própria música, bem como a própria imagem transmitida levam-me a crer que se englobam perfeitamente no fenómeno Pós-Modernista. O facto desta “afirmação musical” se pautar pela utilização de instrumentos tradicionais portugueses faz com que haja um certo paralelismo com um outro fenómeno que é o da Glocalização. Ou seja, a pertença a um mundo global e globalizado não implica que haja uma homogeneização nos comportamentos e na construção de cultura.
Apesar de serem conceitos diferentes, Globalização e Pós-Modernismo coexistem e, do nosso ponto de vista, completam-se, uma vez que a junção de vários elementos de um passado cultural tradicional de um país, por exemplo, pessoaliza-o e globaliza-o. Ou seja, há uma afirmação do ser português (no nosso caso), não deixando de lado a integração no mundo global. E é isto que se passa com a nossa música. A saudade do passado sempre existiu, mas com o Pós-Modernismo, talvez se esteja a substituir o tempo verbal.
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