sábado, 5 de maio de 2007

Dias e dias de Mãe - Com três letrinhas em penas

Ainda oiço a tua voz:
“Era uma vez uma princesa
No meio do laranjal...”

Eugénio de Andrade

Essa princesa que me sussurravas ao ouvido pertencia ao mundo imaginário de flores cantadas por passarinhos brancos. Junto ao muro, cobria os meus pensamentos com o cheiro à fruta que dava cor ao pôr-do-sol que me acenava. A linha do horizonte oscilava entre as folhas verdes do pomar e o azul cinzento do céu. Não pensava em mais nada, nem sei se pensava. Apenas sentia o que se deparava diante dos meus olhos, sentia-te!

Quem esquece o que foi nunca terá memória suficiente para se lembrar daquilo que será. A mãe, semente de vida que nos gerou, constrói o mundo que nos servirá de rede para as possibilidades que se nos apresentam ao longo da vida. Esta, mesmo nua “ou por isso, quero vestir-lhe o meu poema / só porque tu existes, vale a pena!”

Joana, pequeno palmo de gente, mostra os seus poucos dentes de leite quando lhe pergunto pela mãe. Os seus pequenos lábios de chocolate movem-se lentamente ao sabor de um qualquer desenho animado e dizem com a inocência que a caracteriza: “A minha mãe é a melhor mãe do mundo”.

Irrequieta, e com os olhos pequeninos como duas azeitonas verdes, olha o baloiço que, preso por duas correntes frias, liberta os sonhos que balançam no mundo azul de Joana. Sorriu mais uma vez e correu rumo ao futuro que a esperava.

Rita Andrade, a mulher que aos 26 anos se tornou na mãe de Joana, fala sobre a filha com o título de uma música de Sérgio Godinho. As certezas do seu mais brilhante amor não encontram fronteiras no mundo filosófico da lua da sua filha. Iluminados pelo sol, os cabelos de Rita voam ao sabor do vento, o mesmo que faz balançar o corpo frágil da sua filha. “Para mim, o Dia da Mãe é um dia igual aos outros”, afirma. “Gosto das lembranças que a minha filha me dá, mas o mais importante é eu estar com ela”.

Por seu lado, junto ao mesmo parque onde as bolas coloridas viajam de mão em mão, Cátia Vieira olha atentamente a sua pedra filosofal, aquela que lhe alimenta o ego de uma eterna juventude. “Não dou importância a esse Dia, apenas desejo a felicidade da Inês”. Esta, que tem o nome de rainha cujo sangue não seca, brinca com as amigas pela areia de uma praia limitada. O mar apenas existe nos seus olhos, azuis profundos colados na cara de miniatura. “Vou-lhe dar uma flor”, afirma entre lábios rasgados, “uma flor muito bonita”.

O Dia da Mãe já é celebrado desde os tempos da Grécia Antiga, com as comemorações primaveris em honra de Rhea, mulher de Cronos e Mãe dos Deuses. Em Roma, as festas comemorativas do Dia da Mãe eram dedicadas a Cybele, a Mãe dos Deuses romanos, e as cerimónias em sua homenagem começaram por volta de 250 anos antes do nascimento de Cristo.

Já no século XVII, a Inglaterra celebrava o “Domingo da Mãe”, no 4º Domingo de Quaresma, com o intuito de homenagear todas as mães inglesas. Neste período, a maioria da classe baixa inglesa trabalhava longe de casa e vivia com os patrões. No Domingo da Mãe, os servos tinham um dia de folga e eram encorajados a regressar a casa e passar esse dia com a sua mãe.

Com o crescimento do Cristianismo na Europa, passou a homenagear-se a “Igreja Mãe”, que era encarada como a força espiritual que dava vida e protegia do mal todos os servos da cruz. Ao longo dos tempos a festa da Igreja foi-se confundindo com a celebração do Domingo da Mãe. As pessoas começaram a homenagear tanto as suas mães como a Igreja.

Do outro lado do Atlêntico, a comemoração de um dia dedicado às mães foi sugerida pela primeira vez em 1872 por Julia Ward Howe e algumas apoiantes, que se uniram contra a crueldade da guerra e lutavam, principalmente, por um dia dedicado à paz.

A maioria das fontes é unânime acerca da ideia da criação de um Dia da Mãe. Em 1904, Anna Jerwis entrou em profunda depressão após ter perdido a sua mãe. Preocupadas com aquele sofrimento, algumas amigas da jovem norte-americana tiveram a ideia de perpetuar a memória da mãe de Annie com uma festa. Esta quis que a homenagem fosse estendida a todas as mães, vivas ou mortas. Em pouco tempo, a comemoração e consequentemente o Dia das Mães alastrou-se por todo o país e, em 1914, a data foi oficializada pelo presidente Woodrow Wilson, sendo esta o segundo domingo de Maio.

Segundo a jovem norte-americana, neste dia deveriam implementar-se novas medidas para um pensamento mais activo sobre as nossas mães. Através de palavras, presentes, actos de afecto e de todas as maneiras possíveis, as mães deveriam sempre receber prazer e felicidade no coração que tantas vezes verte sangue por amor.

Actualmente, poucos têm conhecimento do que verdadeiramente os faz festejar o dia da mãe. Porém, o que se sente no encarnado da nossa bomba de vida transborda qualquer sensível mundo de Platão.

Em Portugal, até há alguns anos atrás, o dia da mãe era comemorado a 8 de Dezembro, mas actualmente o Dia da Mãe é no 1º Domingo de Maio, em homenagem a Maria, Mãe de Jesus.

E, mesmo aqueles que já não a têm, que já não adormecem com os lábios quentes e ternos a beijarem-nos o rosto e a aconchegar os lençóis, não esquecem o que verdadeiramente lhes deu a vida.

Mãe:
Abre os olhos ao menos, diz que sim!
Diz que me vês ainda, que me queres.
Que és a eterna mulher entre as mulheres.
Que nem a morte te afastou de mim!

Miguel Torga

André Pereira
Foto: Paula Oliveira

O Despertar

1 comentário:

Anónimo disse...

muito profundo... gostei!!!
um grande abraxo
:]
mariorui_@tugamail.com