segunda-feira, 30 de janeiro de 2006

No teu Poema


"No teu poema
existe um verso em branco e sem medida,
um corpo que respira, um céu aberto,
janela debruçada para a vida.

No teu poema
existe a dor calada lá no fundo,
o passo da coragem em casa escura
e, aberta, uma varanda para o mundo.


Existe a noite,
o riso e a voz refeita à luz do dia,
a festa da Senhora da Agonia
e o cansaço do corpo que adormece em cama fria.

Existe um rio,
a sina de quem nasce fraco ou forte,
o risco, a raiva e a luta de quem cai ou que resiste,
que vence ou adormece antes da morte.

No teu poema
existe o grito e o eco da metralha,
a dor que sei de cor mas não recito
e os sonhos inquietos de quem falha.

No teu poema
existe um cantochão alentejano,
a rua e o pregão de uma varina
e um barco assoprado a todo o pano.

Existe um rio
a sina de quem nasce fraco ou forte,
o risco, a raiva e a luta de quem cai ou que resiste,
que vence ou adormece antes da morte.

No teu poema
existe a esperança acesa atrás do muro,
existe tudo o mais que ainda escapa
e um verso em branco à espera de futuro."
José Luís Tinoco

segunda-feira, 2 de janeiro de 2006

Deus

Como primeiro texto de 2006, escolhi "Deus", um texto da minha autoria. Achei o texto mais adequado para iniciar o ano, uma vez que por "ele" se age, por ele se reage, por ele se mata.

Não nego. Porém, a questão da Tua existência perturba o meu espírito e as minhas acções. Sinto que não existes mas persistes por toda a parte, sinto que nunca foste mas serás sempre qualquer coisa. Os extremos aproximam-me de Ti e sinto, nessas alturas, que Tu poderás eventualmente existir. Mas quando tudo aquilo que vejo se revela tristemente real, a dúvida emerge e navega a alta velocidade no meu mar de ideias inconstante. Por vezes, olho a estibordo e tenho a máxima certeza da Tua existência. Mas quando olho a bombordo, a Tua pessoa é afogada e afirmo com raiva e convicção que Tu não existes. Paro para pensar e não consigo encontrar respostas. Talvez um dia seja forçado a ver o invisível e me juntarei, então, à homogeneidade rebânica que Te segue cegamente.

André Pereira