sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

Entrevista ao Ano 2006 - "É preciso muita dranquilidade"

Diário de Fictícias – Bom dia, senhor 2006!
2006 –
Diga? Vai ter que falar mais alto… Já estou muito velhinho e não tenho a genica de outros tempos…

DF – Queria falar consigo sobre a sua vida que, apesar de curta, foi muito conturbada…
2006 –
Sim, tem razão. Tenho de aproveitar ao máximo os 12 meses que tenho de vida e, frequentemente, faço aquilo que não devia. Mas, como diz o povo, a vida são 365 dias e o Carnaval são 366…

DF – Desculpe, mas está a fazer alguma confusão... “A vida são dois dias e o Carnaval são 3”. Esta é a citação correcta.
2006 –
Pois, mas disseram-me que aqui em Portugal o Carnaval é durante todo o ano… E eu próprio notei isso durante este período…

DF – Como assim? Viu muita gente a desfilar nas ruas ao som do samba?
2006 –
Neste país, o Carnaval é muito diferente do do Brasil, mas vi muitas palhaçadas. No que diz respeito à música, apesar de este ter sido o ano de Mozart, estava sempre a ouvir o Bailinho da Madeira.

DF – Gosta que lhe dêem música, portanto… Que balanço faz dos seus primeiros meses de vida?
2006 –
Bem, essencialmente, tentei continuar o trabalho do meu pai. Aqui em Portugal, as nossas gerações não são muito diferentes, até porque raramente há uma mudança significativa de mentalidade. Foi eleito um novo Presidente e, por coincidência ou não, arderam mais uns cavacos por este país.

DF – Este ano o país não poderia deixar de arder… Afinal houve quem tivesse festejado o dia da Besta…
2006 –
Desculpe mas eu não gosto que tratem assim as pessoas. Se não gosta daquele senhor do Norte, não tem que lhe chamar nomes…

DF – O dia da Besta foi no dia 6/6/6… Não é minha intenção criticar ninguém. Aliás, se precisasse de o fazer, acho que escreveria um livro…
2006 –
Ah, sim… Pensava que estava a falar de outra pessoa. Mas, já agora que fala em literatura, parece que surgiu uma publicação que tem sido o Sol deste fim de ano. Aliás, tem colocado muita gente à sombra e, por vezes, ao bater nos objectos dá-lhes uma cor dourada… Mas não me posso pronunciar sobre esse assunto… Ainda não li o livro. Só falo em tribunal e na presença do meu advogado.

DF – No que respeita a filmes, qual foi o seu preferido?
2006 –
Gostei bastante da adaptação a cinema do “Auto da Barca do Inferno”, do Senhor Gil Vicente, porque mistura vários géneros: desde o terror, passando pelo drama e acabando na comédia. Também gostei muito de um filme franco-italiano, em que, no final, o mau da fita dá uma cabeçada no inimigo.

DF – É inédito alguém entrevistar um ano, como eu estou a fazer, entrevistando-o a si. Talvez devêssemos entrar para o Guiness… O que acha?
2006 –
Tenha calma, é preciso ter muita “dranquilidade”, como diz o senhor Bento.

DF – Mas, normalmente, as palavras do Bento não são muito bem-vindas no mundo islâmico…
2006 –
Referia-me ao Paulo, o treinador dos leões!

DF – Ah, peço imensa desculpa! Acho que é das horas… Está a ficar tarde e temos de ir. Ainda tenho que ir fazer um doce para a noite de Natal.
2006 –
Talvez seja isso. Eu não gosto muito de açúcar, prefiro salgados…

DF – Como eu o compreendo… Gostei muito de ter falado consigo, foi muito amável para com o Diário de Fictícias.
2006 –
Ora essa, o prazer foi meu. Brevemente virá a minha substituição. E certamente ninguém sairá para as ruas a protestar…

quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

Biafra

Biafra foi um momento decisivo na minha vida porque comecei a ver crianças a morrer. Perdi o meu interesse pelos soldados que são treinados para matar pessoas. Mas quando se vê uma criança caída no chão, rastejando, morrendo… Elas não pediram essa crueldade.

Don McCullin

Esta fotografia representa a fome no Biafra. Os Igbos da Nigéria Oriental declararam-se independentes em 1967, cortando as ajudas ao Biafra. Em 3 longos anos de guerra, mais de um milhão de pessoas morreu, a maioria devido à fome. As crianças morriam em sofrimento por falta de proteínas essenciais. O seu corpo ficava deformado e a toda a força que possuíam era inútil. O repórter de guerra Don McCullin fez com que o mundo acordasse para esta tragédia. A Comunidade Mundial interveio com vista a ajudar o Biafra, acabando por adquirir novas formas de lidar com a fome em grande escala.

Don McCullin viveu de perto muitas guerras (Vietname, Congo Belga, Biafra, Líbano e Israel) e, hoje, arrepende-se de muita coisa que viu. Apesar da fama que alcançou, o preço que está a pagar é demasiado elevado. Anualmente, o fotógrafo recebe diversas cartas pedindo conselhos para a cobertura de guerras. A sua resposta é sempre a mesma: vá fotografar a paz, é muito mais difícil.

Don McCullin nasceu em 1935 no seio de uma família pobre do norte de Londres. Aos 18 anos foi chamado a cumprir o serviço militar oferecendo-se como voluntário para repórter fotográfico. A sua dislexia impediu-lhe que passasse nos exames de admissão, contudo aprendeu a usar a máquina fotográfica.

McCullin recebeu propostas de emprego de vários jornais, entre eles o London Observer. Em 1964, o jornal londrino atribuiu-lhe a missão de cobrir a guerra civil no Chipre. Foi a sua primeira experiência de guerra, conseguindo excelentes fotografias. Muitas outras guerras se sucederam (Vietname, Congo, Biafra…) e McCullin sempre com a sua objectiva apontando para a destruição. Apesar de odiar a guerra, o fotógrafo sente que tem o dever de mostrar ao mundo a miséria e tragédia que existe numa guerra, tanto da parte dos soldados como da parte dos civis.

No Biafra fotografou os efeitos da fome – esqueletos famintos, corpos vazios…, encontrando por diversas vezes o rasto da morte.

Já no Reino Unido, continuou o seu trabalho, fotografando os mendigos de Londres indo, posteriormente, para a zona de conflito da Irlanda do Norte. Fotografou ainda refugiados do Bangladesh, a guerra no Cambodia, entre outras. A guerra havia-se tornado parte da sua vida e é, nesta altura, que decide voltar a Inglaterra e dedicar-se à fotografia mais urbana.

domingo, 24 de dezembro de 2006

Maria, José, Mor, Gado

Maria José Morgado foi nomeada, no dia 14 de Dezembro, para dirigir e coordenar todos os processos relativos ao caso " Apito Dourado".

Esta nomeação tem como objectivo "uma coordenação eficaz no sentido de imprimir a dinâmica e rigor necessários à descoberta da verdade material", de acordo com uma nota da Procuradoria-geral da República lida em conferência de imprensa.

A decisão não poderia ser a melhor prenda de Natal para todos aqueles que anseiam pela justiça em Portugal, com especial atenção no futebol. Numa altura festiva em que escrevemos cartas ao Pai Natal, houve alguém que não se esqueceu de escrever ao Menino Jesus. E parece que a carta foi parar à morada correcta: a barraca de Belém.

Pode parecer confuso o que eu estou a escrever, mas passo a explicar: a versão mais simples e simbólica do presépio é constituída pelas seguintes figuras: o Menino Jesus, José, Maria, a Vaca e o Burro.

Só aqui encontramos várias explicações: a mãe de Jesus (Maria) encontra-se ao lado de Seu pai (José), rodeados pelo Burro e pela Vaca (o Gado). No centro encontramos Jesus, o símbolo do Amor para os Cristãos. Agora, qual receita de culinária, basta-nos juntar o nome “Maria” com “José” e “Gado”: Maria José Gado. Mas o apelido da senhora não é assim tão estranho, tem um “mor” no início, que podemos decifrar (de uma forma muito código-da-vinciana) como diminutivo de Amor (=Jesus).

Agora, misturamos tudo, juntamos uma colherzinha de açúcar, uma pitada de sal e colocamos no forno durante 15 minutos. O resultado é “Maria José Morgado”.

Bela prenda! Agora só resta ter fé e esperar que os Reis Magos cheguem a tempo de presentear quem merece.

André Pereira

Pois, é Natal...

Nesta altura do ano os mails enchem a nossa caixa de correio e o telemóvel não pára de tocar… Somos invadidos por palavras como Amor, Paz, Felicidade, Alegria, etc… Infelizmente, a maioria destas palavras não coincide com aquilo que sentimos e, por mais absurdo que pareça, recebemos estes substantivos de quem menos esperamos. O cinismo toma conta de todos nós e chamamos “amigo” a pessoas cujo nome não nos lembramos…

Eu, ao escrever este texto, estou decerto a confirmar parte do que acima escrevi. Esta mensagem é para amigos, conhecidos, familiares, e muitos outros… Espero que a decifrem consoante o que vos vai no coração e no cérebro.

Desejo, apenas, que tenham um Bom Natal e que o ano de 2007 se transforme consoante o vosso trabalho e sacrifício. Porque não basta esperar que nos caia algo do céu…

Texto: André Pereira
Imagem: Bart

Bicicleta de Passeio

Agosto 2006, Holanda

Acordei sobressaltado, fiz a mala à pressa e olhei-me no espelho. O meu rosto tinha envelhecido e o cabelo justificava a minha idade. O meu corpo tornara-se enferrujado e esquecido, agarrado ao meu passado e aos caminhos que percorri, tal qual uma bicicleta de passeio.

Texto e Fotografia: André Pereira

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

Conto de Natal - Reis de Belém

O Diário de Fictícias, envolvido por este espírito que envolve todo o mundo cristão, mas, essencialmente, todo o mundo EUROpeu, decidiu acompanhar os Reis Magos e ir à Terra Natal entregar alguns presentes ao menino.

– Basta seguir aquela estrela – disse Belchior.
– Mas aquela estrela leva-nos até Sintra, e não a Belém, que é onde queremos ir – responde Baltazar.
– Ele tem razão, Belchior. Devemos antes guiarmo-nos pelo nosso GPS, e não fazer como aquele senhor que, apesar de gerir a empresa SGPS, não se soube orientar. E nós não queremos aparecer na lista de devedores ao fisco, pois não? Muito menos que as nossas companheiras publiquem um livro a incriminar-nos – diz Gaspar.
– Segundo o sistema, devemos ir por aquela rua – afirma Baltazar, apontando a direcção.
– Por aí vamos dar ao estádio de futebol onde também mora um Jesus, mas não é bem esse que queremos encontrar. – remata Belchior.

Assim começou a longa viagem que os três Reis Magos e a nossa equipa de reportagem fizeram até à Terra Prometida*. Chegados a Belém, deparámo-nos com um luxuoso palácio, protegido por guardas imponentes. Fizemos as apresentações, mostrámos os convites e, após terem verificado se nos encontrávamos bem vestidos (o essencial era ter o cinto bem apertado), os guardas que, apesar da noite escura se encontravam de óculos de sol, abriram a porta e entregaram-nos um cartão de consumo mínimo.

Algo incrédulos com aquela recepção, dirigimo-nos ao local onde se encontrava a família reunida, à volta de um cavaco em chamas que aquecia a casa.

– Boa noite, senhores! – disseram em coro os Reis Magos – Cada um de nós tem uma prenda para vos oferecer.
– Senhor José, para si tenho esta caixa de ferramentas. Como bom carpinteiro que é, espero que faça bom uso para tratar da Madeira. E, como sei que também tem dotes de jardinagem, ofereço-lhe estas rosas para plantar.
– Obrigado Belchior, agora é a minha vez de oferecer a minha prenda à “nova inquilina”. É uma caixinha com ouro, mas cá dentro tem um objecto que anda, literalmente, na boca de muita gente… Espero que faça melhor uso que os habituais utilizadores…
– Por último – continuou Gaspar – tenho este espremedor de laranjas para o senhor Silva. Devido às críticas de que tem sido alvo, acho que este é o presente ideal.

A família agradeceu calorosamente aos Reis Magos que, após terem cumprido o consumo mínimo através do pagamento de vários impostos, abandonaram o local sem a certeza de voltarem no próximo ano.

*Terra Prometida não no sentido de estar na agenda de aquisições de alguém mas sim porque é lá onde se fazem muitas promessas.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

O Amor

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente

Não sabe o que há-de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer.

Ah, mas se ela adivinhasse,

Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pr'a saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;

Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe

O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...

Fernando Pessoa

Wishlist

Querido Pai Natal, Menino Jesus, Reis Magos e afins

Aqui está a minha lista de desejos:

A Cura de Schopenhauer, de Irvin Yalom
E se Eu Gostasse Muito de Morrer, de Rui Cardoso Martins
Cemitério de Pianos, de José Luís Peixoto
Hitler, de Marleis Steinert
O Confessor, de Daniel Silva

Ligação Directa, de Sérgio Godinho

André Pereira

quarta-feira, 20 de dezembro de 2006

“Café com ‘Dinossauros’ da Comunicação”

Foi no passado dia 4 de Dezembro, por volta das 21h30, que muitas pessoas se juntaram para ver os dinossauros. Não me refiro a nenhuma visita ao Jardim Zoológico, nem sequer a uma ida ao cinema, mas sim de uma ida ao café. Foi este o local eleito pelos estudantes do 4º Ano de Ciências de Informação do Instituto Superior Miguel Torga para reunir, na mesma mesa, os verdadeiros “Dinossauros da Comunicação”.

Moderado pelo também “Dinossauro da Comunicação”, Sansão Coelho esta conversa recebeu o contributo de Varela Pècurto (fotojornalista e primeiro correspondente da Televisão RTP em Coimbra e na Região Centro), Jorge Castilho e Cabral de Oliveira (jornalistas que trabalharam no Jornal de Coimbra, Diário de Coimbra, Jornal da Universidade de Coimbra, Centro, para além do exercício de funções em delegações de jornais e rádios nacionais, como o Jornal de Notícias, o Comércio do Porto e a TSF). Por motivos de força maior, Álvaro Perdigão, também ele um Dinossauro na área radiofónica (um dos pioneiros do Emissor Regional de Coimbra da Emissora Nacional, actual RDP, e também antigo colaborador do Diário de Coimbra), não pode estar presente.

Reunidos num local histórico da cidade de Coimbra, o Café Santa Cruz, os convidados falaram das suas experiências vividas dentro do meio jornalístico. Todas as estórias contadas poderiam servir de base para a elaboração de um livro, ou até mesmo de um filme, qual delas a mais contagiante. Desde lembranças de sorrisos, até outras mais tristes, tudo foi captado pela objectiva da máquina fotográfica, pela tinta da caneta ou pelo simples microfone.

No final, o público terminou esta sessão com aplausos e muitos elogios. Estas aulas abertas promovidas pelo Instituto Superior Miguel Torga já contaram com a participação de outros nomes ilustres como Carlos Esperança (blog
Ponte Europa), João Campos (actual Director do Diário de Coimbra), João Henriques (correspondente do Correio da Manhã), Paulo Marques (jornalista do Diário As Beiras), e Rui Avelar Duarte (ex-Director de Informação da LUSA e actual jornalista do Campeão das Províncias).

André Pereira

terça-feira, 19 de dezembro de 2006

Entre o Luar e o Arvoredo

Entre o luar e o arvoredo,
Entre o desejo e não pensar
Meu ser secreto vai a medo
Entre o arvoredo e o luar.
Tudo é longínquo, tudo é enredo.
Tudo é não ter nem encontrar.

Entre o que a brisa traz e a hora,

Entre o que foi e o que a alma faz,
Meu ser oculto já não chora
Entre a hora e o que a brisa traz.
Tudo não foi, tudo se ignora.
Tudo em silêncio se desfaz.

Fernando Pessoa

segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

You

Desta vez não há nomes próprios, apelidos ou caras risonhas. Simplesmente “You”. É a tradicional escolha da revista Time para "Person of the Year", que este ano não é bem uma, mas muitas pessoas. Com esta escolha, cujo critério é de âmbito muito alargado, a Time quer destacar qualquer pessoa que usa ou produz conteúdos para a Internet, como nós.
Fonte: Público

domingo, 17 de dezembro de 2006

Hey! Anda cá.

Tens dois minutos? Ou fazem-te falta? Sabes o que faz realmente falta? Mais loucura. Mais malucos. Não os “grandes malucos” mas os verdadeiros e as verdadeiras. Aqueles que perdem tempo para falar com os pombos; que vêem quadros onde os outros só vêem paredes; os aventureiros e as aventureiras que acreditam, ainda, haver qualquer coisa no fim do arco-íris. O verdadeiro poder é tu decidires o mundo à tua volta; questionar o estabelecido, as certezas e os costumes, para acreditar que tudo pode ser diferente. É preciso mais absurdo, mais ideias insensatas. Cinco bailarinas a jogar à bola de tutu cor de rosa. Passeios cobertos com relva e flores. Ou, muito simplesmente, trepar a uma árvore quando te apetece. Tu é que mandas. Se gostas de música pirosa, gostas e pronto. Queres cantar alto no meio da rua, deixa-te ir. Se preferes não dar muito nas vistas, anda nas calmas. É preciso rirmos e dançarmos e darmos abraços e beijinhos. O importante é levarmos tudo mais a brincar, até as coisas sérias.

Anúncio Yorn
Fotografia: Hugo Macedo

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

Entrevista à Saia da Carolina - "Sou saia de uma só pessoa"

Diário de Fictícias – Olhe desculpe… por favor… com licença… Olhe, saia da frente que eu estou a trabalhar!
Saia –
Eu até saía mas depois não tinha entrevistado...

DF – Ah, peço imensa desculpa, mas não reparei… Está muito diferente desde a última vez que a vi…
Saia –
Sim, a minha vida sofreu algumas alterações. E é por isso que convoquei esta conferência de imprensa, para mostrar ao país, e também ao mundo, que eu sou saia de uma só pessoa.

DF – Como assim? Sinceramente não estou a perceber…
Saia –
O meu nome, hoje em dia, anda na boca de toda a gente. Não vamos mais longe, há bocadinho você empurrou-me, “Saia da frente!”. Na televisão utilizam-me até ao esgotamento, coitadinha da Floribella. Para não dar outros exemplos! Mas eu, em exclusivo para o Diário de Fictícias, venho dizer, publicamente, que sou saia de uma só pessoa! E essa pessoa é a Carolina!

DF – A Carolina? Não estou a ver quem seja…
Saia –
Não sabe quem é a Carolina? Onde está a sua cultura literária e musical? Uma excelente dançarina como ela e não sabe… Sinceramente…

DF – Não me diga que está a falar “daquela” Carolina…
Saia –
Não se lembra da Carolina? “A saia da Carolina tem um lagarto pintado, sim Carolina ó i ó ai, não Carolina ó ai meu bem”. E a saia sou eu, mas não era verdadeiramente um lagarto que eu tinha pintado, era mais um camaleão, mudo facilmente de cor.

DF – Confundi com outra Carolina que, por acaso, também tinha um animal, mas fantasioso…
Saia –
Ah, estou a ver… Aliás, tinha dois: um pinto e um outro que cuspia muito fogo, mas parece que agora se anda a queimar. Enfim, quem brinca com o fogo queima-se, não é verdade?

DF – E o que tem a dizer da Rosa?
Saia –
Desde já lhe digo que não irei divulgar a minha preferência política! Tanto posso ser rosa, como laranja, azul ou até encarnada.

DF – Não é isso… Estou a falar da Rosa pessoa…
Saia –
Ah sim, a Rosa. Peço desculpa mas agora eu é que fiquei confusa. Já não bastava a Rosa que só me arredondava, arredondava… Todos os dias andava tonta, por essa razão é que decidi dar o direito de exclusividade à Carolina.

DF – Quais são os objectivos futuros?
Saia –
O meu maior desejo é ser reconhecida na rua como a saia que, não só tapou as pernas, como também os olhos de muita gente. O apito final ainda está longe, mas quando chegar a altura, espero fechar este ciclo com chave de ouro.

TV belga provoca onda de choque – Flandres proclama a independência... a fingir

A cadeia de televisão belga RTBF interrompeu quarta-feira a programação para anunciar que «a Flandres proclamou a independência», «o rei deixou o país!» e «a Bélgica já não existe», num exercício de ficção política que fez disparar as audiências.

«Isto pode não ser uma ficção»... A mensagem de alguns segundos precedeu o genérico de uma edição especial do telejornal que anunciava a secessão da Flandres.O anúncio inesperado provocou, ao que parece, estupefacção e até o pânico de alguns telespectadores.Muitos ficaram convencidos pelos directos, as reportagens a quente nos eléctricos bloqueados na nova fronteira e as reacções de verdadeiras personalidades políticas belgas a congratularem-se ou a denunciarem a proclamação unilateral desta independência pelo parlamento flamengo.

O número para telefonar indicado pela RTBF no início da edição especial cedo ficou saturado. «A nossa central foi inundada de chamadas e os jornais francófonos recebem também muitas reacções», indicou o porta-voz da RSBF, Bruno Deblander.

«As pessoas acreditaram e quando lhe explicamos que é uma ficção, algumas dizem que é um escândalo, outras ficam tristes ou contentes que isso seja falso», acrescentou, reconhecendo que a iniciativa podia ser «contestável e que ela seria contestada».

Mas nesta emissão que recria à sua maneira a Guerra dos Mundos de Orson Welles, a RTBF apostava em «pôr na praça pública o debate que anima todos os belgas».

Governo francófono exige investigação

Esta quinta-feira surgiram as reacções mais violentas ao que o gabinete do primeiro-ministro belga Guy Verhofstadt já classificou como «uma piada de mau gosto».«É dever da televisão pública informar correctamente o público, não criar confusão», afirmou o porta-voz de Verhofstadt.

O governo da Valónia, a região francófona da Bélgica, pede uma investigação sobre o «escandaloso» programa de meia-hora que surpreendeu o país, e questiona a ética dos jornalistas participantes.

Um país dividido

A Bélgica é um reino dividido entre três comunidades linguísticas (flamenga, francófona e alemã) e três regiões federais (Flandres, Valónia e Bruxelas). A Flandres, que é simultaneamente uma comunidade e uma região, representa metade mais de metade de todos os belgas e quase metade do território nacional.

Nesta região, que ocupa o Norte da Bélgica, vivem 6 milhões de flamengos, um povo germânico que fala uma série de dialectos próximos do Neerlandês (a língua da Holanda). Quase metade dos flamengos não fala o Francês, o idioma da zona Sul da Bélgica.A Flandres é também historicamente mais rica e industrializada que a Valónia (a região francófona do Sul), factor apontado pelos independentistas como mais um motivo para a separação, uma vez que estes argumentam que os francófonos vivem à custa da região do Norte.
Fonte: Sol

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

Zidane de regresso a casa

A estrela de futebol Zinedine Zidane numa demonstração das suas qualidades durante a visita a uma enfermaria para crianças abandonadas em Corso, Argélia.

Fonte:
Sol

Passeio dos Prodígios

Vamos lá contar as armas
tu e eu, de braço dado
nesta estrada meio deserta
não sabemos quanto tempo as tréguas vão durar...

Há vitórias e derrotas

apontadas em silêncio
no diário imaginário

onde empilhamos as razões para lutar!

Repreendo os meus fantasmas

ao virar de cada esquina
por espantarem a inocência

quantas vezes te odiei com medo de te amar...

Vejo o fundo da garrafa

acendo mais outro cigarro
tudo serve de cinzeiro
quando os deuses brincam é para magoar!

Vamos enganar o tempo

saltar para o primeiro comboio
que arrancar da mais próxima estação!

Para quê fazer projectos
quando sai tudo ao contrário?

Pode ser que, por milagre,
troquemos as voltas aos deuses

Entre o caos e o conflito

a vontade e a desordem
não podemos ver ao longe
e corremos sempre o risco de ir longe demais

Somos meros transeuntes

no passeio dos prodígios
somos só sobreviventes
com carimbos falsos nas credenciais

Vamos enganar o tempo...


Jorge Palma

quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

Fic Notícias: Cartas ao Pai Natal

Em todo o lado se ouvem os cânticos de Natal, as ruas vestem-se de cores vivas para chamar a atenção de quem nelas passeia e as luzes brilham fazendo das noites dias luminosos. As crianças, junto à lareira, pegam numa caneta e num pedaço de papel e escrevem os seus sonhos para enviar para o Senhor das Barbas Brancas. Mas não só as crianças o fazem, também muitos adultos, e alguns, bem conhecidos por todos nós.

Fátima Felgueiras:
“Oi cara, você me pode trazer o que quiser mas, em vez de ser num saco encarnado, preferia que as prendas viessem num saco azul.”

Floribella:
“Olá Pai Natalzinho! Eu queria que as crianças fossem muito felizes e que houvesse paz no mundo. Eu sou muito pobrezinha, super-hiper-mega-ri-pobrezinha e o meu principezinho não gosta de mim…”

Teixeira dos Santos:
“Vamos cá ver, o shôr Nicolau anda de país em país no seu trenó e não paga os seus impostos? Quanto às renas, tem licença para andar com elas? Venham daí esses euritos.”

Pinto da Costa:
“Estou a escreber-te esta carta para entregares algumas prendas a estes senhores de negro. Para mim não quero nada porque nunca me dei muito bem com indibíduos de bermelho. Penso eu de que….”

Papa Bento XVI:
“Eu gostava que me oferecesses um barrete igual ao teu. É que eu já dei um quando “declarei guerra” aos muçulmanos.”

Luís Filipe Vieira:
“Camarada Pai Natal! Como prenda queria um bom treinador. E, já agora, como grande benfiquista que o senhor é, vai-me comprar um kit de sócio do Glorioso. E as suas renas e os seus duendes também porque eu sei, e toda a gente sabe, que o Benfica é também o Maior do Mundo Imaginário.”

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

O fogo que arde no Natal

Lá fora está frio, a chuva cai intermitentemente e o sol aparece escondido por entre as nuvens. Está o tempo ideal para ficar em casa, enrolado nos cobertores, moldar o corpo ao sofá e, com aquela magnífica invenção humana que é o comando, controlar o nosso mundo visual com um simples movimento do polegar. “Vamos acender a lareira”, ouve-se em uníssono pela sala de estar. Talvez não seja pior, até porque este frio é intenso e, como a lua nos vem visitar mais cedo do que nas outras alturas do ano, sabe sempre bem ter os pés descalços junto ao lume que nos abstrai das preocupações diárias.

A família reúne-se e, tal como na música de Paulo de Carvalho, todos os meninos brincam com os seus bonecos e bonecas, carros e puzzles. Inventam a sua liberdade e tentam, maioritariamente com sucesso, interferir na liberdade dos seus pais. “Quero este Action-Man, o Noddy e o seu carro amarelo e o Power-Ranger Azul!”, “Eu quero uma saia e umas sapatilhas da Floribella e um Nenuco que come sozinho!”. Quem já não ouviu estas palavras da boca “inocente” de uma criança? E os pais, meros comandos televisivos, invertem posições hierárquicas e são chefiados pelos mais pequenos que exigem e alcançam todos os seus objectivos. Claro que as crianças fazem-no de forma inconsciente, pois o seu mundo ainda não contempla responsabilidades económicas que mais tarde lhes causarão muitas dores de cabeça.

Mas a caixinha mágica, que nos tem proporcionado tantas alegrias e nos permite olhar e ver o mundo que nos rodeia também tem o seu lado menos correcto. A versão manipuladora da televisão (que sempre existiu e nunca deixará de existir) tem-se virado, nestes últimos anos, para a captação da atenção das crianças. De forma aparentemente inofensiva, as empresas publicitam até à exaustão os seus produtos através dos mais variados meios de comunicação, com especial relevo para a televisão. Antes e depois de um programa infantil com elevada audiência, durante o horário nobre, ou seja, sempre que é possível fazê-lo. Não quero estar a retirar o direito à publicidade destas empresas, antes pelo contrário, mas penso que chegámos a um ponto de saturação que tem feito com que o Natal perca todo o seu sentido (o nascimento de Jesus, independentemente para quem acredite ou não).

A Coca-Cola substituiu o menino Jesus pelo Pai Natal e inventou outras noções para o mesmo. A tónica baseada no Amor, Paz, Harmonia, Felicidade, União (e todos os outros conceitos que ninguém respeita na sua totalidade) desapareceram, dando lugar ao Euro, ao Cartão Visa, ao cheque (muitas vezes em branco, da cor da neve) que está ao alcance de todos, mesmo ao alcance daqueles que não têm possibilidades. Até a própria data é antecipada meses antes (sim, já havia enfeites de Natal no mês de Outubro!) para contribuir para este espírito de Amor Universal!

Lá fora continua frio, a chuva cai de forma mais intensa e o sol, que agora já deu lugar à lua, quando aparece, não é para todos. Talvez seja mesmo melhor acender a lareira e aquecer os pés descalços cansados de caminhar.

André Pereira

sábado, 2 de dezembro de 2006

Poesia - Quadras de um País

Depois de semanas inquietas
Em que tudo se contestou
Decidimos fazer de poetas
E escrever o que se passou.

Os estudantes fecham a escola
Criticam a governação
Preferem jogar à bola
A ter aulas de substituição.

A temperatura está alterada
Balança entre o calor e o frio
Metade do país está alagada
Outra passeia no Rossio.

Há números que fazem sonhar
E outros que nem queremos ver
Os primeiros permitem viajar
E os últimos sobreviver.

E o nosso rico futebol
Segue o seu itinerário
Faça chuva ou faça sol
É comandado pelo empresário.

E para quem gosta de dançar
E fazer as coisas à sua maneira
Nada melhor que arranjar par
Para um bailinho da Madeira.

Tudo o que acima foi escrito
É o retrato desta Nação
Que deseja sempre o infinito
Mas nunca tira os pés do chão.

quarta-feira, 29 de novembro de 2006

Iniciação

Não dormes sob os ciprestes,
Pois não há sono no Mundo.
O corpo é a sombra das vestes
Que encobrem teu ser profundo.

Vem a noite, que é a morte,
E a sombra acabou sem ser.
Vais na noite só recorte,
Igual a ti sem querer.

Mas na Estalagem do Assombro
Tiram-te os Anjos a capa:
Segues sem capa no ombro,
Com o pouco que te tapa.

Então Arcanjos da Estrada
Despem-te e deixam-te nu.
Não tens vestes, não tens nada:
Tens só teu corpo, que és tu.

Por fim, na funda Caverna,
Os Deuses despem-te mais.
Teu corpo cessa, alma externa,
Mas vês que são teus iguais.

A sombra das tuas vestes
Ficou entre nós na Sorte.
Não estás morto, entre ciprestes.
Neófito, não há morte.

Fernando Pessoa

segunda-feira, 27 de novembro de 2006

Poema

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco

Mário Cesariny

Tempo para mudar de botas

Um soldado israelita muda de botas à saída de um carro de combate perto do "kibbutz" de Mefalsim, no Sul de Israel, junto à fronteira com a Faixa de Gaza. A trégua acordada entre as duas partes, que pela primeira vez em cinco meses trava o lançamento de "rockets" palestinianos e as operações militares israelitas em Gaza, trazem a esperança de que as negociações de paz sejam retomadas.

domingo, 26 de novembro de 2006

Livro do Desassossego de Bernardo Soares - 17.

São horas talvez de eu fazer o único esforço de eu olhar para a minha vida. Vejo-me no meio de um deserto imenso. Digo do que ontem literariamente fui, procuro explicar a mim próprio como cheguei aqui.

Fernando Pessoa

sábado, 25 de novembro de 2006

Contra a violência sobre as mulheres

Quando chegava o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, um grupo de manifestantes no Paquistão acenderam velas para apoiar uma lei que protege as mulheres paquistanesas contra crimes como a violação.

Fonte:
Público

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Rómulo Vasco da Gama de Carvalho (24 Novembro 1906 - 19 Fevereiro 1997)

Máquina do Mundo

O Universo é feito essencialmente de coisa nenhuma.
Intervalos, distâncias, buracos, porosidade etérea.
Espaço vazio, em suma.
O resto, é a matéria.
Daí, que este arrepio,
este chamá-lo e tê-lo, erguê-lo e defrontá-lo,
esta fresta de nada aberta no vazio,
deve ser um intervalo.

António Gedeão

Parabéns Sónia (24 Novembro 1970)

Logo passo por tua casa para comer uma fatia de bolo.

Alunos e professores unidos: “Queremos ir para casa estudar!”

São 8h30 da manhã. O dia está escuro e sopra um vento agreste que dá vida aos ramos das árvores e levanta as folhas espalhadas pelos passeios… Contudo, ao contrário do que se possa pensar, a rua está repleta de pessoas que, tremendo tanto como varas verdes, seguram cartazes e gritam palavras de ordem. A campainha toca pela primeira vez mas ninguém parece ouvir. Os portões estão fechados e a chuva bate constantemente nas placas de zinco que abrigam alguns professores.

Pela primeira vez em muitos anos, a escola vê todos os seus professores e alunos no seu recinto e em luta pelos mesmos ideais. É hora de ir para a aula, mas “mais importante que aprender é, seguramente, lutar pelos seus direitos e protestar contra a política vigente”, são estas as palavras de um professor que se manifesta neste dia chuvoso.

Entoando conhecidos gritos de guerra, adaptados à situação em que nos encontramos, professores e alunos unem-se numa só voz e gritam cada vez mais alto, ao verem que estão a ser filmados e entrevistados pelo Diário de Fictícias e outros meios de comunicação.

É neste ambiente de antítese com o tempo que se faz sentir que pedimos a opinião de alguns manifestantes:

“Epa, somos estudantes e não concordamos com as aulas de substituição porque se tivéssemos feriado íamos para casa estudar, pah!”
Estudante

“Eu não sei a razão do protesto mas acho muito bem porque assim não temos aulas.”
Estudante

“Estamos todos unidos contra esta política de discriminação e achamos que a senhora ministra deveria saber o que custa dar aulas das 9h às 16h, ter férias de 2 meses, e escolher o seu próprio horário que mudaria de opinião em relação a nós”
Professor

quarta-feira, 22 de novembro de 2006

A Velha Coca-Cola e o Novo Vêgê

Como telespectador atento que sou, tenho mantido uma vigilância permanente sobre o meio audiovisual e a sua repercussão no nosso mundo actual. A Publicidade é um dos conteúdos que me fascina e, ao contrário de grande parte das pessoas, muitos são os minutos que despendo com os olhos colados aos mais variados anúncios.

De há uns tempos para cá, dois anúncios saltaram-me à vista mas, essencialmente, ficaram no meu pensamento mais tempo do que o normal. A minha primeira reacção foi de surpresa, contudo, após alguns visionamentos mais cuidadosos, notei em mim algum receio, especialmente num deles. Fiquei surpreendido porque, apesar de seguirem as
regras publicitárias, estes dois anúncios afastam-se, de certa maneira, da onda em que até então todos navegavam, criando a sua própria estrutura. O outro sentimento que enumerei é o receio, uma vez que estes anúncios (com especial atenção para um deles) aproveitam um momento de “distracção humana” para entrar no inconsciente das pessoas.

Falo dos anúncios da
Coca-Cola e do óleo Vêgê. No primeiro, a personagem principal é um senhor idoso, de fato-de-treino, praticando diversas actividades físicas demonstrando, assim, a sua excelente forma. O senhor diz que sempre bebeu Coca-Cola e que, apesar de se dizer que o refrigerante é utilizado para “limpar as engrenagens” e “não estar provado que faça bem”, ele continua a beber porque fá-lo sentir feliz. E, “se a felicidade aumenta a esperança de vida, continuarei a beber”.

Por sua vez, o segundo anúncio centra-se numa rapariga na flor da idade. Esta, apresenta, de forma bastante natural, o produto desprezando, por completo, o ambiente envolvente (“Não precisamos de uma bonita cozinha, com um cozinheiro famoso, umas crianças para dar um ar querido e uma super-modelo a apresentar”). Contudo, ao dizer tudo isto, está a captar a atenção do público para esse mesmo aspecto, o espaço envolvente que, nesta película se baseia numa parede branca onde a protagonista cria o seu próprio meio. Esta simplicidade na promoção do produto leva a uma conclusão lógica, referida pela actriz: “Desculpem, vamos continuar com anúncios maus mas com um óleo muito bom”.

Ora, estes dois anúncios causaram em mim surpresa não só pela sua originalidade mas também pela sua “mudança de rumo”, como já havia referido. Contudo, é o anúncio da Coca-Cola que provoca em mim o tal sentimento de receio. Isto porque, se analisarmos bem o anúncio, o texto não confirma nem desmente os malefícios da Coca-Cola, colocando a sua tónica no elemento primordial, a Felicidade! Por entre imagens raras nos dias que hoje correm (um homem de 84 anos em excelente forma), a Coca-Cola como que “injecta” lentamente no nosso inconsciente a frase “a Coca-Cola até pode fazer mal, mas dá felicidade”. E é aqui que eu sinto medo. Isto porque, se até então as pessoas já suspeitavam da qualidade deste refrigerante, a partir de agora sabem, por fonte segura, que provavelmente faz mal. A máxima que este anúncio estabelece e pretende moldar na mente humana é a seguinte: “Façamos o que nos apetece! Até podemos consumir produtos que nos irão prejudicar mas o importante é estarmos felizes.”

Desde sempre que a Coca-Cola nos tem habituado a anúncios de elevada qualidade, mas não nos esqueçamos que foram estes senhores que criaram o Pai Natal. Esperemos que não criem, também, “esta” felicidade.

Este tipo de publicidade é muito difícil de combater pois a própria marca diz “toda a verdade” mas acrescenta um novo elemento (“O nosso produto faz mal, mas dá felicidade” ou “Os nossos anúncios são maus mas o óleo é bom”).

As pessoas continuarão a beber Coca-Cola, eu próprio continuarei a fazer parte deste grupo. As vendas do óleo Vêgê irão, decerto, aumentar como consequência deste anúncio. Mas é importante saber ver os anúncios, e não apenas olhar…

André Pereira

terça-feira, 21 de novembro de 2006

Beija-me!

“Beija-me, aperta-me, acaricia-me muito. – Ela possuía também poesia para seu uso, conhecia palavras que cantavam, que enfeitiçavam e produziam um rufar de tambores – Beija-me… – Fechou os olhos, a sua voz transformou-se num murmúrio ensonado. Beija-me até ao paroxismo, aperta-me sem fraqueza, acaricia-me.”

Admirável Mundo Novo
Aldous Huxley

segunda-feira, 20 de novembro de 2006

“Antes de Bolonha, os alunos eram papagaios amestrados”

A aula de Representações dos Media do dia 15 de Novembro foi diferente para os alunos de Comunicação Social do Instituto Superior Miguel Torga. José Henrique Dias, Presidente do Conselho Pedagógico do Instituto, dirigiu, a pedido do professor Dinis Manuel Alves, uma aula que rapidamente se transformou numa amena conversa entre o orador e o seu público.

“O Processo de Bolonha” foi o tema escolhido pelo Prof. Dr. José Henrique Dias para iniciar este diálogo com os estudantes. Como todos sabemos, este processo tem causado muitas reacções do mundo político e, essencialmente, estudantil. Todas estas ondas de discórdia são contrapostas por outras de completa concordância, nas quais se engloba José Henrique Dias.

“Com Bolonha, há uma mudança total de paradigma, tal como aconteceu na passagem da Medievalidade para o Renascimento e do Teocentrismo para o Antropocentrismo. Se, neste último caso, se passou de uma crença em Deus como estando no centro do Universo para uma crença no próprio Homem, com Bolonha surge-nos uma semelhante mudança”. É com estas palavras que José Henrique Dias inicia o seu discurso, captando, de imediato, a atenção dos alunos. “Tendo em conta as devidas proporções, antes de Bolonha o ensino encontrava-se centrado na figura do Professor. Só ele era o detentor do saber e tudo teria que ser feito conforme ele dizia, não deixando espaço para a livre pesquisa dos seus alunos, comportando-se como papagaios amestrados. É isto, essencialmente, que Bolonha pretende alterar, dando mais liberdade ao estudante para pesquisar, investigar e tirar as suas próprias conclusões, adquirindo diversos saberes e competências”.

Desta forma, continua o orador, “não se visa tirar responsabilidade ao professor, antes pelo contrário, que terá um papel decisivo na formação do aluno, uma vez que será mais uma ponte de ligação para o conhecimento.”

José Henrique Dias, nascido em Coimbra, recordou ainda com saudade os bons momentos da sua juventude e o seu início bastante prematuro no mundo do trabalho. “Os tempos eram difíceis e, como tive um filho muito cedo, tinha de ganhar dinheiro”, afirma o Professor. “Escrevi para vários jornais e até cheguei a fazer horóscopos e a vestir a pele de consultor sentimental”.

A conversa alongou-se durante cerca de duas horas, alternando entre momentos de transmissão de saber e momentos mais leves. Em ambos, os alunos mantiveram-se bastante atentos, colocando questões pertinentes sobre os mais variados assuntos abordados.

A capacidade oratória do Professor Doutor José Henrique Dias, bem como a sua inteligência fizeram desta tarde uma verdadeira montra de saberes que, segundo ele “não estão fechados em gavetas, mas sim em constante convivência”.

André Pereira

sexta-feira, 17 de novembro de 2006

Governo Fictício corta despesas - Proposta de Orçamento 2007

O Diário de Fictícias apresenta, em primeira-mão, a proposta orçamental do Governo Fictício para o ano de 2007. É de fonte segura que confirmamos este plano governamental, passando, desde já a invocar as principais áreas a serem atingidas:

Economia:

A Economia irá crescer de uma forma gradual, especialmente devido às bases em que se irá sustentar. Os passeios irregulares serão substituídos por bancos que, limadas algumas arestas, tornarão a subida mais segura e confortável.

Desporto:

No próximo ano prevê-se um aumento de agentes da polícia nos estádios de futebol. Isto porque Jorge Costa irá fazer parte da equipa técnica do Sporting de Braga e, após ter visto tantas vezes a cor vermelha em forma de cartão irá agora vesti-la. Até aqui tudo normal, não fosse o facto de o antigo jogador do FC Porto gostar muito de a ver na pele dos adversários.

Descendo até à capital, os trabalhadores do metro de Lisboa já puseram mãos à obra com vista a construir um Tonel que ligará Portugal ao Brasil. Esperemos que não seja mais um Canal da Mancha.

O Chefe de Estado já convocou uma reunião com o Presidente do SL Benfica com vista a assinar um pacto de união entre Nações. Se este encontro tiver os efeitos previstos pelo Governo, Portugal será, à semelhança do Benfica, o maior País do Mundo.

Sociedade:

Há uma nova esperança para os desempregados em Portugal. O Governo propõe um plano de migração para a Madeira, a fim de tratar dos jardins e dos pomares do arquipélago. A falta de jardineiros é uma realidade naquela região e as laranjas são cada vez menos nutritivas.

Ambiente:

O Governo aprovou um plano com a intenção de tratar os resíduos tóxicos em Portugal. A fábrica de Souselas foi a escolhida, mas o método será diferente. Uma reunião entre o Ministério do Ambiente e o Chefe dos Lixos Tóxicos fez com que se chegasse a um acordo mútuo: todos os lixos irão fazer greve e prometem não vir para a rua fazer manifestações. Assim, o caso ficará resolvido, pelo menos durante o próximo ano.

quarta-feira, 15 de novembro de 2006

Na Palma do Coração

E assim, com um simples pestanejar de olhos, debruçou-se sobre a tão presente ausência e pensou... e sentiu... Todos os livros que folheava e flores que cheirava traziam-lhe à memória os seus curtos e lisos cabelos a caírem-lhe sobre o rosto de menina. Mais tarde, quando mergulhava sobre a cama, não prometia visitá-la em sonhos, adormecendo apenas com ela no pensamento. Demorava a entregar-se ao sono mas o inconsciente era algo que nunca compreendera e, talvez por isso, tivesse um certo receio em atravessá-lo durante a noite. De manhã, ao acordar, uma leve brisa inundava o seu quarto, passando-lhe ao de leve pela barba de três dias. Levantou-se, esfregou os olhos com a ponta dos dedos e, ainda meio a dormir, arrastou-se até à casa-de-banho. Dez minutos bastaram para que saísse de lá a cantar, enrolado na sua toalha azul. Vestiu-se, ao som de Jorge Palma, e preparou-se para sair.

André Pereira

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

1 Ano de Tinta Electrónica

Um ano passou e o tempo continua. Para uns é tempo de acordar, abrir os braços e viver! Para outros, o tempo é escasso e nada melhor que esvaziar uma garrafa e gastar o salário em nicotina.

Para estes e para os restantes tenho escrito, na esperança de os apoiar no seu objectivo de vida mas também na esperança de fazer pensar. Gosto de provocar, apoiar, incentivar, criticar, ajudar, crescer, amar e viver! E são estas as palavras que compõem o objectivo máximo deste blog, tantas palavras que por vezes se misturam no meu coração e viajam às cavalitas do sangue que percorre todo o meu corpo…

Espero que todos os que habitualmente visitam as minhas letras continuem a fazê-lo. Olhem para elas, sorriam, chorem, cantem, gritem, escrevam!

Comigo, continuarão os meus pedaços de saudade que vou traduzindo em palavras. Saudade passada, saudade do que irei sentir e saudade de tudo aquilo que nem sequer entrará no meu dicionário mental.

André Pereira

sexta-feira, 10 de novembro de 2006

A confirmação do óbvio: Benfica Maior do Mundo!

O Benfica entrou oficialmente para o Guinness Book of Records como clube com mais associados do Mundo, precisamente 160.392 sócios, número que figurará na edição de 2007 do mais famoso livro de recordes.

O certificado, que arrebatou o estatuto aos ingleses do Manchester United, que "reinavam" com 152.000 associados, foi hoje entregue ao presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, que dentro de três anos quer atingir a meta dos 300.000 sócios.

"A ideia é ir batendo anualmente o nosso próprio recorde até chegar à meta dos 300.000", frisou o dirigente, que quer agora centralizar nos sócios a estratégia do novo mandato.

Nesse sentido, o futuro canal de televisão do Benfica "permitirá aperfeiçoar a comunicação com sócios e adeptos" para atingir o ambicioso objectivo dos 300.000 associados, "aliando uma estratégia empresarial ao sentido da paixão".

"Hoje tivemos o reconhecimento mundial da nossa grandeza. Mas tracei uma meta e quero lá chegar. Agora, queremos que todos os sócios tragam um amigo ou familiar benfiquista para se filiar. Só com essa ajuda poderemos alcançar os 300.000", alertou o presidente do Benfica.

Para Luís Filipe Vieira, serão os associados a determinar as ambições do Benfica no futuro próximo: "são eles que vão dizer se querem ou não um Benfica na Europa".

Aproveitando a época festiva que se avizinha, Luís Filipe Vieira adiantou que será revelado em breve "porque é que o Pai Natal é vermelho", antecipando, sem revelar grandes pormenores, uma campanha que passará também em sensibilizar os associados a oferecer um "kit" como prenda natalícia.

O clube da Luz projecta também o lançamento do "kit sócio" em Angola e deseja reforçar a campanha em curso na América do Norte.

Em meados de Julho, quando o clube assumiu a corrida ao recorde mundial, o Benfica contava precisamente com 151.424 associados, cifra que, na altura, já ultrapassava outros dois "gigantes" mundiais, o Bayern de Munique (Alemanha) e o FC Barcelona (Espanha), ambos com cerca de 145.000 sócios.

Fonte: RTP

Diário de Vendas - 99% de Desconto*

Não se espantem os leitores com o título desta rubrica. O Diário de Fictícias não abandonou o mundo das letras para se dedicar ao comércio de qualquer outro produto. O único diário semanal optou por dar um passo rumo ao desconhecido, dedicando as próximas linhas à divulgação e recomendação de variados produtos que se podem tornar utensílios indispensáveis, tendo em conta a sociedade em que vivemos actualmente.

Graxa – Numa altura em que a aparência é mais importante do que a essência, nada melhor que ter sempre à mão (ou melhor, ao pé) uma pequena caixinha de graxa. Se a utilizar conforme está indicado no rótulo, poderá subir muitos degraus na carreira política. Isto porque os sapatos se tornam mais resistentes, pois claro…

Colete Salva-vidas – O mau tempo vai chegando e, com ele, outras inundações irão causar alguns danos. Mas, para evitar males maiores, nada melhor que ter bem colado ao corpo um colete que, para além de o proteger de outros perigos, impede que se afogue mais em dívidas. Muitos são aqueles que se vestem de gala mas esquecem-se que actualmente vivemos num Titanic moderno: mais tarde ou mais cedo iremos bater com um iceberg que nos chama à realidade e aí, será tarde demais.

Martelo – Qualquer cidadão responsável tem na sua garagem, junto de todas as outras ferramentas, um martelo que é essencial para construir, arranjar ou destruir, conforme a situação. É a ferramenta mais importante de qualquer carpinteiro, uma vez que trabalha com a madeira e, por vezes, é preciso uma boa martelada para ela amolecer. Basta de bichos da madeira!

Cartaz – Hoje em dia, mais importante que saber ensinar ou até mesmo aprender, é ter um cartaz com frases de ordem e insultuosas contra alguma coisa. Pode-se até nem saber do que se trata, mas é essencial ter um!

* Brevemente, será este o número percentual que iremos descontar para a Segurança Social

quinta-feira, 9 de novembro de 2006

“Quero ser optimista, mas entendam o meu pessimismo!”

No passado dia 8 de Novembro de 2006 decorreu, no Instituto Universitário Justiça e Paz, em Coimbra, uma conferência intitulada “Imprensa regional: que futuro?”, proferida pela professora Ana Tamarit Rodríguez, da Universidade Pontifícia de Salamanca.

Promovida pelo Secretariado Diocesano das Comunicações Sociais de Coimbra, esta conferência contou com a presença de muitos estudantes e profissionais de jornalismo da região de Coimbra, representantes de jornais como o “Diário de Coimbra”, “Campeão das Províncias”, “Diário as Beiras”, entre outros.

Tendo como base o tema “Jornalismo Regional”, Ana Rodríguez começa por afirmar que este tipo de imprensa não pode ser considerado de segunda categoria mas sim como diferente de todas as outras.

Num mundo em que a informação navega rapidamente por todo o mundo, a imprensa regional ocupa um papel bastante importante na sociedade, ao contrário do que dizem muitos analistas.

Dirigida a públicos menos numerosos, o círculo de influência é, obviamente, menor. Habitualmente, encontra-se afastada dos centros de poder e os conteúdos referem-se a contextos mais próximos do seu público. Por conseguinte, acede a uma cota de mercado mais pequena, obtendo menos receitas.

Esta informação global chega ao público de formas diferentes. Podemos definir três: descida das elites em cascata, ebulição desde as bases até ao topo e identificação com os grupos de referência. No cimo, encontramos as ideias das elites económicas e sociais. Seguem-se as ideias das elites políticas e governamentais. Como mediador de informação entre as elites e o “povo” temos uma rede de comunicação massiva, pessoal que transmite e difunde as mensagens. Na base desta pirâmide, temos os líderes de opinião a nível local e a estagnação do público e da massa. Logo, a informação, depois de ter passado todos estes níveis, não nos chega da melhor forma.

Esta hierarquia faz-nos pensar na questão da liberdade, uma vez que não acedemos à mesma informação que outras classes acedem. Segundo Ana Rodríguez, “não pode haver liberdade que não tenha informação suficiente para detectar a mentira”.

A oradora aproveitou para fazer a comparação entre Espanha e Portugal, no que diz respeito à importância da imprensa regional. Se, em Portugal, esta ainda não despertou, o mesmo não se pode dizer em relação a Espanha, que conheceu um forte desenvolvimento nesta área.

Esta globalização surge nos anos 80 (simbolicamente com a queda do Muro de Berlim), criando-se grupos multimédia que funcionam como um todo – “pensam globalmente, actuam localmente”.

Estes grupos mediáticos encontram-se implantados em quase todas as regiões, dedicando-se à imprensa, rádio e televisão. Não operam só na região de origem, mas tentam conquistar outros mercados.

Por seu lado, a imprensa regional actua em locais pequenos, com escassos recursos e poucos jornalistas. Depende, portanto, de uma economia que depende de inversões publicitárias do poder local e regional.

Apesar de tentar oferecer informação, a imprensa regional desinforma e entretém, sendo raramente contestada por outra notícia. Notamos, ainda, o predomínio de declarações (“Segundo X…”), como que defesa da sua própria profissão.

Os jornalistas locais são, na sua maioria, gente jovem, sendo os cargos superiores encabeçados por homens.

No final da sua apresentação, a professora Ana Tamarit Rodríguez concluiu com uma frase que marca esta conferência: “Quero ser optimista, mas entendam o meu pessimismo!"
André Pereira

quarta-feira, 8 de novembro de 2006

Afinal Picasso vai à praça

Na segunda-feira, um juiz de Manhattan suspendeu a venda do Retrato de Ángel Fernández de Soto, de Pablo Picasso, porque segundo Julius Schoeps a sua família foi obrigada a vendê-lo durante a Segunda Guerra Mundial. Ontem, o mesmo magistrado decidiu que afinal a pintura pode ir à praça num leilão que a Christie`s tem agendado para hoje, em Nova Iorque. A obra faz parte do período azul de Picasso e é um dos quadros mais procurados do pintor espanhol.

Fonte: Público
Foto: Kirsty Wigglesworth/AP

terça-feira, 7 de novembro de 2006

IV

Encerraram-te aqui as cinzas veneradas;
Esta urna te contém, eternamente, agora,
Nela também existo e as noites e alvoradas
Passem, pouco me importa, ululando lá fora.

Tenho-lhe a adoração das relíquias sagradas,
Pois este relicário onde o meu sonho mora,
Contém, para a minh’alma, as ilusões passadas
E a pulverização do teu perfil de outrora.

É-me grato sentir, pelas noites sem termo,
Toda a apaziguação do meu tormento vário,
Tendo-te junto a mim a aclarar o meu ermo.

Tendo-te junto a mim, sob este alampadário,
E ver com que saudade e com que esforço enfermo,
Morre a luz em redor do teu incinerário...

Poemas de Morte, Emílio de Menezes

segunda-feira, 6 de novembro de 2006

Esquecimento

Quando eu morrer,
Sem o cansaço inútil da jornada
- Porque nunca senti -
Sem o manto sublime da amargura
- Porque nunca chorei -
Sem a réstia de fogo da alegria
- Porque nunca me ri -
Aqueles que me odiaram,
Os poucos que me acolheram
E os muitos que nunca vi,
Hão-de chorar por convenção
Ou sorrir por teimosia.
Mas nunca mais ninguém se lembrará
Do pobre que nunca riu
Nem chorou
Nem sentiu.

José Carlos Ary dos Santos

domingo, 5 de novembro de 2006

A revolta de Saddam

Saddam Hussein gesticula contra o juiz no momento em que, hoje de manhã, ouviu a sentença que o condenou à morte por enforcamento por crimes contra a humanidade perpetrados na localidade xiita de Dujail, onde foram massacradas 148 pessoas.

Na sessão de hoje do Tribunal Especial Iraquiano, Saddam gritou várias vezes “Deus é grande” e “Longa vida à Nação”. O antigo presidente do Tribunal Revolucionário iraquiano, um dos três meios-irmãos de Saddam e ex-chefe dos serviços secretos, foram sentenciados com a mesma pena.

Fonte: Público
Foto: David Furst/AP

Negras Lágrimas de Sal

E assim, sem esperança e sem qualquer réstea de ilusão, os olhos enchem-se de sal que vai escorrendo pela face arredondada de um futuro que apenas vê o que a janela lhe mostra...

André Pereira

sábado, 4 de novembro de 2006

Entrevista à Lata - Lata Enlatada

Hoje o dia começou mais tarde para a maioria da população estudantil de Coimbra. Já o sol tinha dado lugar à lua quando as capas negras se levantaram para mais uma noite alegre.

O fuso horário já havia mudado, contudo, nestes dias de festa a Torre da Universidade congela os ponteiros, e o badalar dos sinos é substituído pelos ritmos ensurdecedores vindos do outro lado do rio.

Mas para conhecer verdadeiramente o que se passa na outra margem, nada melhor que dar a palavra à personagem principal deste autêntico filme nocturno.

Diário de Fictícias – Boa noite, Senhora Lata!
Lata –
Olha quem ele é… É preciso ter-me para vir falar comigo. Depois do que aconteceu entre nós…

DF – Desculpe, mas não estou a perceber. O que aconteceu?
Lata –
Não se lembra? Já me andou a arrastar pelas ruas de Coimbra…

DF – Sim, mas já lá vai o tempo. Falemos do que interessa. Como se sente nesta altura do ano, em que uma cidade vive para si?
Lata –
Sabe, já estou habituada a este protagonismo. Durante o ano, os estudantes preferem a garrafa e o copo, mas para começar nesta vida nada melhor que ter lata.

DF – Isso é verdade! É preciso coragem para ficar acordado horas e horas a fio durante a noite e no dia seguinte faltar às aulas…
Lata –
Faltar a quê? Eu sou a verdadeira universidade neste início de ano, e olhe que os meus alunos são assíduos e pontuais! Para além de não faltarem, esgotam em segundos as minhas salas de aula.

DF – Alguns clientes do seu espaço dizem que se sentem como sardinhas enlatadas quando assistem às suas aulas…
Lata –
É normal sentirem-se como sardinhas, não é por acaso que nos encontramos junto ao rio…

DF – Mas o Mondego parece não ser apenas uma fonte de sardinhas… Há rumores de alguns tubarões…
Lata –
Sim, confirmo esses boatos. E, como muita gente já reparou, tive de os colocar na entrada do recinto… Podem não ser muito comunicativos e até mesmo violentos para com as pessoas, mas não tinha outra opção. O mais que pude fazer foi convidar o cão do Mickey, um tigre e alguns GNR para ver se conseguem acalmar os ânimos.

DF – Mas no final é habito a festa acabar em xutos e pontapés… Bem, o nosso tempo está a chegar ao fim, mas ainda há uma última questão que lhe gostava de colocar… Qual é a sua ideia em relação ao estado do Ensino em Portugal?
Lata –
Eu acho que o ensino vai muito bem e a crise económica de que tanto se fala não tem tido repercussões na minha actividade. Antes pelo contrário, a cada ano que passa vou ganhando adeptos. Até já pensei em fazer uma OPA à UC.

domingo, 29 de outubro de 2006

Fic Notícias - À luz de um orçamento que representa o ensino

Neste período de crise que atravessamos, o Diário de Fictícias decidiu ouvir os lamentos das pessoas sobre aquilo que as preocupa. Guerra, desemprego, preço da gasolina, salários… Foram estes items que colocámos na nossa agenda mas, ao contrário do que esperávamos, saiu-nos tudo ao contrário…

Electricidade:
“Sinto-me no meio de um Guerra, aliás, de uma guerra entre os consumidores e aqueles que me controlam. Sinceramente, espero que o meu valor se amplie, até porque sou muito valiosa para todos! As pessoas, ao nascer, são-me oferecidas, eu sou essencial ao seu crescimento, gostam de ir ao meu estádio, não conseguem ler nem escrever sem a minha ajuda e, até ao morrerem, vêem-me ao fundo do túnel… Seria um ‘choque eléctrico’ se me perdessem.”

Orçamento:
“Muito bom dia, meus senhores! Ainda não estou autorizado oficialmente a falar, só para o ano, mas posso dizer que me sinto muito satisfeito com a dieta rigorosa que estou a programar fazer. Correm boatos que continuarei a abusar dos doces, mas não passa disso mesmo, verdades. Ah, desculpe, quer dizer, boatos!”

Rivoli:
“Gostei muito deste período de férias a que tive direito. Por outro lado, tudo o que foi noticiado dava para uma excelente peça de teatro… É algo a pensar. Sabe (olhando para todos os lados), por agora ainda posso falar consigo em público, mas daqui por uns tempos, se quiser combinar uma entrevista, só em privado.”

Declaração de Bolonha:
“Ainda sou muito novinha para poder criticar mas penso que mais novos são aqueles que me criticam. O desemprego não me aflige, até porque eu tenho dado muito trabalho, especialmente aos estudantes. Mas não há que preocupar, ninguém precisa de ficar com os olhos em bico. Até porque eu nem sei fazer arroz; o meu prato preferido é esparguete… à bolonhesa, pois claro!”

segunda-feira, 23 de outubro de 2006

Soneto do Cativo

Se é sem dúvida Amor esta explosão
de tantas sensações contraditórias;
a sórdida mistura das memórias
tão longe da verdade e da invenção;

o espelho deformante; a profusão
de frases insensatas, incensórias;
a cúmplice partilha nas histórias
do que outros dirão ou não dirão;

se é sem dúvida Amor a cobardia
de buscar nos lençóis a mais sombria
razão de encantamento e de desprezo;

não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso!

David Mourão Ferreira

sexta-feira, 20 de outubro de 2006

Um Jogo Sustenido: Chopin ou Eusebio?

Não se trata de uma luta pelo título de figura mais importante da Europa. Se, por um lado, temos um dos melhores compositores musicais do século XIX, Frédéric Chopin, por outro encontramos um dos melhores jogadores de futebol… da Polónia!

É verdade, não se trata de Eusébio da Silva Ferreira mas sim de um outro que, embora com qualidades bastante diferentes das do “original”, é considerado por muitos como um dos melhores jogadores do seu país.

E assim, o verdadeiro “combate” trava-se entre o compositor de mazurcas e polonesas e o médio ofensivo que recentemente deu música a Portugal.

Até então, Chopin era o símbolo deste país do Velho Continente. Contudo, no dia 11 de Outubro de 2006, surgiu um novo ídolo para os polacos, Eusebio Smolarek.

Esta figura obteve enorme destaque após ter combatido bravamente contra a Nossa Senhora do Caravaggio que pretendia conquistar um dos quatro territórios que o seu comandante lhe pedira, acabando por derrotá-la com dois tiros à queima-roupa.

Nossa Senhora (certa do fim da crise que se abatera à sua volta) entrou demasiado benevolente no terreno, criando muitos espaços ao seu adversário. Este, não teve qualquer problema em controlar os 90 minutos, devido, em boa parte, à pouca valentia dos homens vestidos de negro.

O ambiente encontrava-se tão escuro como um nocturno de Chopin até que, vindo do nada, Eusebio escavou uma rocha bastante mole e atirou certeiro sem qualquer hipótese de fuga para a presa.

Prontamente, todos os santinhos se prontificaram a ajudar Nossa Senhora mas, apenas perto do final do encontro, um anjinho que não faz mal a ninguém, conseguiu atingir Smolarek com um difícil golpe certeiro.

Contudo, essa resposta não foi suficiente por duas razões muito simples: primeiro porque o resultado não se alterou até final e segundo porque o Nuninho (anjinho que reduziu a diferença) despenteou-se de tal forma que teve de ser transportado de urgência para o cabeleireiro mais próximo.

As reacções de ambas as partes fizeram-se notar. Smolarek foi aplaudido de pé e o seu País declarou-o como herói nacional; Caravaggio aceitou a derrota, e afirmou que estava a brincar quando disse que Portugal não estava em crise.

De realçar o apurado sentido de humor de um dos nossos representantes.

Afinal, estamos mesmo a passar por um mau momento…

E, é por isto mesmo, que agora se discute qual a música que os polacos mais gostam de ouvir, a de Chopin ou a de Eusebio.

quinta-feira, 19 de outubro de 2006

O Documentário de Mariana Otero

O documentário de Mariana Otero (1997) mostra uma televisão privada como nunca antes se vira. Como objecto de estudo do seu trabalho, a cineasta escolheu a estação portuguesa SIC, caso ímpar na Europa em termos de audiência atingindo, em poucos anos de existência, os 50% de share.

Apesar das imagens exibidas corresponderem à realidade diária da SIC, uma realidade em que se dá primazia às audiências em detrimento da qualidade, esta é apenas parcial.

Mariana Otero optou por deixar de parte as grandes reportagens, os debates, programas como “O Século do Povo”, “Tostões e Milhões” e “Internacional SIC”, as reportagens da BBC e National Geographic, e o apoio à música e teatro nacionais.

Sendo legítimo, por parte da SIC, a crítica a Mariana Otero, esta cumpriu aquilo que se propôs a fazer inicialmente, saber de que maneira uma estação tão nova conseguiu atingir tais níveis de audiência.

Durante a execução deste projecto, Mariana Otero não se deparou com qualquer entrave na captação da imagem Emídio Rangel atribuiu-lhe livre-trânsito para o fazer, acabando, posteriormente, por criticá-la pela exibição de determinadas imagens.

Se, por um lado, esta exposição pode prejudicar a SIC tanto na obtenção de patrocínios como nas próprias relações internas entre os seus funcionários, por outro, beneficia a estação na medida em que estabelece a sua notoriedade no plano televisivo europeu.

No nosso entender, Mariana Otero alcança o seu objectivo primordial. É certo que, no seio da SIC, o produto final não foi bem recebido, mas isto porque os seus responsáveis não terão compreendido bem o intuito da cineasta.

André Pereira
José Santiago

terça-feira, 17 de outubro de 2006

Praça do Comércio Português: “Queremos trabalhar, mas sem sair do lugar!”

Esta semana o Diário de Fictícias decidiu vir para a rua, sentir o cheiro a castanha assada e ouvir o burburinho constante da capital de Portugal. Depois de muito caminho percorrido, deparámo-nos com a estátua de D. Sebastião de Melo.

Tudo estava normal: as pessoas corriam de um lado para o outro, num stress desenfreado, os cafés apinhados de gente com cigarro na mão, e o rio, lá atrás, compunha a paisagem da bela cidade de Lisboa.

Mas algo se diferenciava naquele retrato paisagístico. Sim, era uma pequena mancha vermelha muito pequenina mas que fazia um barulho desproporcional ao seu tamanho.

Eram pessoas, que se encontravam com bandeiras e faixas de protesto contra o desemprego, contra o Governo, contra a oposição, contra os salários, contra as reformas, contra os subsídios, contra os contratos, contra os estrangeiros, contra o país, contra tudo! Aliás, não havia nada que estas pessoas não criticassem. Quando se propunha alguma medida, elas contra-atacavam de imediato com uma contra-proposta. Exemplar, o abrangente vocabulário destes senhores de punho cerrado.

Após largas horas de tentativa de comunicação com um dos seus líderes (têm muitos), devido ao intenso ruído sonoro, a conversa resumiu-se a pequenas frases de protesto, pois claro:

“Queremos trabalhar, mas sem sair do lugar!”

“Menos horas no emprego para termos mais sossego!”

“Trabalhar é uma seca, preferimos jogar à sueca!”

“O melhor para o empregado é poder trabalhar sentado!”

André Pereira

sábado, 14 de outubro de 2006

Entrevista ao Ponto - "Sou indispensável a qualquer jornalista"

Diário de Fictícias – Ponto para começar? Aliás, pronto para começar esta entrevista?
Ponto –
Sim, pontíssimo! Prontíssimo.

DF – Como lhe expliquei ao telefone, esta nossa conversa irá basear-se no seu trajecto profissional e na sua opinião sobre a actualidade…
Ponto –
Ou seja, quer saber o meu ponto de vista em relação a determinados assuntos…

DF – Exactamente! Comecemos, então, pelo início auspicioso que teve nos palcos do Teatro.
Ponto –
Bons tempos… A princípio não queria enveredar por essa área, mas a pouco e pouco fui descobrindo a arte de representar. Claro que por vezes precisava de ajuda, mas tinha sempre o meu irmão que me apoiava nesses momentos. Foi um bom ponto de partida e uma base que me proporcionou uma outra visão sobre tudo.

DF – Em que aspecto alterou a sua forma de ver o mundo?
Ponto –
Alterou na medida em que alarguei o meu horizonte visual, adoptando pontos de vista diferentes. Sinto que muitas das pessoas encenam a sua própria vida, representando papéis que não são seus. E isso, por um lado, faz-me sentir revoltado mas, por outro, faz com que possa viver de uma forma mais consciente, pois sei os perigos que se me reservam.

DF – Para si, as pessoas são um perigo? Não tem esperança na construção de um mundo melhor?
Ponto –
Calma que eu não disse isso! Vamos cá pôr os pontos nos “is”… Eu era uma pessoa muito tímida e com muitos pontos de interrogação na minha cabeça. Depois do Teatro, já substituí os pontos de interrogação pelos pontos finais e até mesmo por alguns pontos de exclamação! (como este). Hoje, vivo uma vida feliz, com alguns casos pontuais de trabalho árduo, mas nada que me aborreça.

DF – Depois seguiu-se a Televisão…
Ponto –
Sim, o meu próximo amor foi a pequena caixinha mágica. Comecei por trabalhar como estagiário, mas lentamente fui obtendo algum prestígio, até que hoje sou indispensável a qualquer jornalista, especificamente os pivots do telejornal.

DF – Mas foi um amor, a princípio, um pouco atribulado…
Ponto –
(risos) No meu primeiro dia bati com a cabeça numa porta. Ainda levei uns pontos. Rezei a todos os santinhos e ao meu em especial, o Ponto Cruz, para que não me crescesse nenhum galo… Todos sabemos os problemas que os galos nos têm trazido.

DF – É verdade, sim senhor. Ora bem, deixe-me só consultar aqui o meu ponto de apoio, uma pergunta final: ultimamente têm surgido rumores de possíveis ligações com a corrupção desportiva…
Ponto –
Olhe, já viu as horas? Os ponteiros andam cada vez mais depressa. Desculpe mas vou ter que sair. Ainda tenho que ir ao Porto com dois amigos para depois viajar para junto da minha esposa que se encontra nos Açores…

André Pereira