quarta-feira, 2 de maio de 2007

1º Maio 1886 - Mãos Cansadas

“Há aqueles que lutam um dia; e por isso são bons;
Há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons;
Há aqueles que lutam anos; e são melhores ainda;
Porém há aqueles que lutam toda a vida; esses são os imprescindíveis.”

Bertold Brecht

Antecedentes

No século XIX, a “Revolução Industrial”, não descurando todo o desenvolvimento que proporcionou, conduziu também à sujeição dos trabalhadores a condições desumanas de trabalho. A necessidade de se produzir o máximo ao mais baixo custo não respeitava idades nem sexos. As organizações sindicais eram incipientes e perseguidas pelas autoridades policiais.

Em 1864, é criada a Primeira Associação Internacional dos Trabalhadores, em Londres. Esta iniciativa surge num contexto de união entre líderes sindicais e activistas socialistas com vista a dar voz às lutas dos trabalhadores e às nações oprimidas. Esta associação viria a ser a Primeira Internacional Socialista, que duraria sete anos. As divisões ideológicas entre as várias facções (sindicalistas, anarquistas, socialistas, republicanos e democratas radicais, entre outras) puseram fim à agremiação, mas deixaram mais explícitas as reivindicações e propostas pelas quais os trabalhadores se deveriam debater. A redução do horário de trabalho para as 10 horas diárias era uma delas.

Os objectivos saídos desta Internacional tiveram eco no IV Congresso da American Federation of Labor, em Novembro de 1884. As negociações, sucessivamente falhadas com as entidades patronais, fizeram das cidades operárias um barril de pólvora pronto a explodir, até que, no dia q de Maio de 1886, teve início uma greve geral com a adesão de mais de 1 milhão de trabalhadores em todo o território norte-americano. A reacção a esta paralisação foi violenta.


1 Maio 1886

No dia 1 de Maio de 1886 realizou-se uma manifestação de trabalhadores nas ruas de Chicago, nos Estados Unidos da América. A reivindicação por melhores condições de trabalho, entre as quais a redução da jornada laboral para 8 horas diárias, deu início a uma greve geral nos EUA. Três dias depois, confrontos entre a polícia e os manifestantes terminaram com a morte de um civil. No dia seguinte, 4 de Maio, uma nova manifestação foi organizada como protesto pelos acontecimentos dos dias anteriores, tendo terminado com o lançamento de uma bomba por desconhecidos para o meio dos policiais que começavam a dispersar os manifestantes, matando sete agentes. A polícia abriu fogo sobre a multidão, matando doze pessoas e ferindo dezenas. Estes acontecimentos passaram a ser conhecidos como a Revolta de Haymarket. Deste incidente resultou a prisão de oito líderes do movimento. Quatro foram condenados à morte por enforcamento e os restantes a prisão perpétua. Porém, três anos mais tarde, depois da reabertura do processo que levou à condenação dos oito operários, conclui-se que a bomba que explodiu em Chicago tinha sido colocada pela própria polícia.

Curiosos são os títulos de alguns jornais americanos a propósito das manifestações dos trabalhadores. O “Chicago Tribune” dizia na altura: “A prisão e os trabalhos forçados são a única solução adequada para a questão social”. O New York Tribune seguia a mesma linha: “Estes brutos só compreendem a força, uma força que possam recordar por várias gerações”. De sublinhar que nos EUA o chamado Labor Day festeja-se a 3 de Setembro e não a 1 de Maio.


O luto fortaleceu a luta

Três anos mais tarde, dois meses após o nascimento daquele que viria a pintar o mundo de negro, a segunda Internacional Socialista reuniu em Paris e decidiu, por proposta de Raymond Lavigne, convocar anualmente uma manifestação com o objectivo de lutar pelas 8 horas de trabalho diário. A data escolhida foi o 1º de Maio, como homenagem às lutas sindicais de Chicago. Em 1890, o Congresso americano vota a lei que estabelece a jornada de oito horas de trabalho. A 1 de Maio de 1891, uma manifestação no norte de França foi dispersada pela polícia, o que resultou na morte de dez manifestantes, o que serviu para reforçar o dia como um dia de luta dos trabalhadores. Poucos meses depois, a Internacional Socialista de Bruxelas proclama esse dia como dia internacional de reivindicação de condições laborais.

No dia 23 de Abril de 1919 o senado francês ratifica o dia de 8 horas e proclama o dia 1 de Maio desse ano como dia feriado. Em 1920, a Rússia adopta o 1º de Maio como feriado nacional, e este exemplo é seguido por muitos outros países.

O objectivo primordial, conforme a lógica liberal, é “a tomada de consciência dos direitos e deveres sociais e o desenvolvimento da capacidade produtiva para apropriação e transformação da natureza em benefício de toda a população” (Isaura Belloni, 1992).


Em Portugal

Em Portugal, só depois da Revolução de 1974, se comemora o 1º de Maio livremente. O primeiro 1º de Maio celebrado em Portugal depois do 25 de Abril foi a maior manifestação alguma vez organizada no país. Só na cidade de Lisboa juntou-se mais de meio milhão de pessoas. Para muitos, esta foi a forma que os portugueses encontraram para demonstrar a sua adesão ao 25 de Abril, que uma semana antes restituía ao país a democracia.

A decisão da Comuna de Paris de decretar o 1º de Maio como o Dia Internacional do Trabalhador teve repercussões no nosso país. Segundo José Mattoso (in História de Portugal, vol. 5), houve um reforço da luta do movimento operário português em finais do séc. XIX sendo "em torno da associação e da greve que gravita o próprio movimento operário". Entre 1852 e 1910 realizaram-se 559 greves no nosso país. A subida dos salários, a diminuição da jornada de trabalho e a melhoria das condições de trabalho eram as principais exigências dos operários.

Mas, segundo o mesmo autor, o movimento operário alcançava grande força quando "aquelas (associações) a que hoje chamaríamos propriamente «sindicatos» se juntavam com as recreativas, as de socorros mútuos e os centros políticos". Tal ficou demonstrado no 1º de Maio de 1900 que juntou em Lisboa cerca de 40 mil pessoas, numa altura em que "as classes médias ainda viam as organizações de trabalhadores com alguma simpatia".

Durante a I República não se deixou de festejar o Dia do Trabalhador. Porém, um dos primeiros diplomas aprovados, com a instituição do novo regime, dizia respeito ao estabelecimento dos feriados nacionais e destes não constava o dia do trabalhador. Em 1933 é decretada a "unicidade sindical" e o "controlo governamental dos sindicatos", esmorecendo um movimento operário que só ganharia novo ânimo na década de 40. Durante o Estado Novo, as manifestações no Dia do Trabalho (e não do Trabalhador) eram organizadas e controladas pelo Estado.

Actualmente, este festejo acontece de forma cada vez mais esmorecida, muito provavelmente porque as condições reais de vida e trabalho dos trabalhadores se modificaram radicalmente, as relações sindicais com o patronato e o governo têm sido transformadas em mero instrumento institucional de negociação e os novos problemas que surgiram com o avanço da política e ideologia do capitalismo e do liberalismo esperam ainda pela verbalização consciente dum novo equacionar das dificuldades, das modalidades da exploração e das contradições de interesses de classe.

André Pereira
O Despertar

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