sábado, 13 de janeiro de 2007

Reportagem: A Baixa dos Preços Baixos

Apesar de, oficialmente, a época de saldos só ter começado no domingo, as lojas ostentavam já grandes cartazes a anunciar as “Promoções”. Logo a seguir ao período de maior consumo, o Natal, os comerciantes apostam nas reduções de preços para escoarem stocks e para aumentarem a facturação. Apesar do tempo de crise, as vendas sobem, com os clientes a aproveitarem a época de saldos, que se prolonga até 28 de Fevereiro, para renovarem ou rechearem o guarda-roupa.

Historicamente, a época natalícia traz consigo muito frio e promessas de sentimentos pontuais. As pessoas juntam-se à lareira e trocam amor e carinho embrulhados em papel colorido com um laço pomposo. Gradualmente, o verdadeiro espírito natalício tem vindo a desaparecer, dando lugar ao consumismo. Este obriga-nos a “passeios” em ruas apinhadas de gente, a longas filas em centros comerciais, sempre com os olhos postos no nosso relógio. O tempo escasseia e estas semanas passam rapidamente. Tendo todos estes factores em conta, os próprios comerciantes aproveitam esta correria às compras para, logo que a quadra termina, baixarem os preços dos seus produtos, de forma a escoarem mais rapidamente os stocks.

Apesar de, oficialmente, a época de saldos só ter começado no domingo, as lojas de Coimbra começaram logo a seguir ao Natal com o anúncio das promoções. Isto porque os comerciantes estão sujeitos ao pagamento de multas se, em vez de “Promoções” utilizarem a palavra “Saldos”. A diferença encontra-se simplesmente no nome, uma vez que os preços mantêm-se e a afluência de clientes não se altera de forma considerável. Para evitar estas confusões de datas, o Governo já ponderou a hipótese de alterar o início dos saldos para o dia 22 de Dezembro. Esta medida poderá entrar em vigor já neste ano de 2007.

Os próprios consumidores utilizam esta altura de promoções para “trocar artigos de Natal, aproveitando para comprar mais uma camisa, umas calças ou um casaco”, ao verem a diminuição dos preços. Quem o diz é Joana Gonçalves, que costuma passear pela zona da Baixa de Coimbra.

Apesar de ter bastantes lojas espalhadas pela cidade, a empresa “Capicua 303” enquadra-se no universo do comércio tradicional. Como este, muitos são os estabelecimentos que aderem à semana de promoções. A dificuldade óbvia em competir com as grandes empresas durante o ano, aumenta nestas semanas. “Os pequenos comerciantes vêem-se obrigados a baixar os preços para poderem competir com as empresas multinacionais, essencialmente, espanholas”, afirma Liliana Horta, funcionária da loja “Capicua 303”, da Rua Ferreira Borges.

Por seu lado, Rafaela Marques afirma de forma categórica que o número de clientes diminuiu em muito em relação ao ano passado devido, em grande parte, aos grandes centros comerciais Dolce Vita e Fórum. Contudo, “nesta altura do ano, a facturação aumenta, mesmo baixando os preços”, conclui a funcionária da loja Salsa da mesma rua.

Aliás, a Ferreira Borges, uma das mais movimentadas ruas da Baixa de Coimbra, torna-se, nesta altura, um autêntico centro de comércio. As lojas, de um lado e de outro, enfeitam-se para receber o Natal e cativar novos clientes. As pessoas, mesmo em tempo de crise económica, carregam sacos de compras de diversas lojas. “Estamos em crise mas nesta altura os preços baixam e temos de aproveitar”, diz Artur Silva, que utilizou o fim-de-semana para fazer algumas compras de Natal atrasadas.

Euforia comercial em toda a cidade

Mas esta euforia comercial não se remete à Baixa de Coimbra, alargando-se por toda a cidade. Em Celas, por exemplo, os autocolantes de “-50%” saltam aos olhos de quem lá passa. “Já se tem tornado hábito todo este ambiente mas, de ano para ano, as lojas fazem promoções cada vez mais cedo”, afirma Susana Ferreira, residente na Avenida Calouste Gulbenkian.

Nesta altura, as peças de vestuário são as preferidas pelo cliente, que encontra uma grande variedade de escolha em todas as lojas. Muitos são os estabelecimentos que aproveitam para escoar os produtos com defeito ou para desimpedir os stocks. Contudo, alguns mantêm a mesma “linha de venda” durante todo o ano. “Os clientes só têm a ganhar com esta época. Os produtos que estão em promoção são os que habitualmente temos à venda”, argumenta Liliana Horta.

Como é natural, as escolhas dos jovens e dos adultos diferem no que respeita à compra de produtos. Os mais novos optam por lojas “que estejam na moda e onde os preços sejam baixos”, diz José Esteves, estudante de Direito. “Costumo optar pela Salsa, Pull & Bear, El Dorado, entre outros, porque têm roupa jovem”, acrescenta. Por sua vez, os adultos, maioritariamente mulheres, escolhem lojas como a Zara ou Oysho, optando, ainda, muitas vezes, pelo comércio tradicional.

Também a diferença de classes se nota neste início de ano. Apesar de agora estas hierarquias monetárias se esbaterem um pouco, as pessoas de uma classe superior não procuram os produtos pelo preço, mas sim pela sua qualidade. Isto já não acontece com a maioria dos consumidores que prefere o custo em relação à qualidade…
Temos vindo a assistir a uma compacta estandardização do conceito de Natal que não se remete somente ao dia 25 de Dezembro, mas que se alarga a olhos vistos encontrando-se entre semanas de elevado consumo. Um bom exemplo é a Baixa de Coimbra em Dezembro e Janeiro que recebe de braços e portas abertas (com autocolantes enormes a anunciar “Promoções”) todos aqueles que se vão moldando ao novo espírito natalício.

André Pereira

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